Larissa Abreu

Brasil

 

Conexoes de Amefrica

Coração de maré

Epahey

Força Yalodê

Minha travessia pela colagem

Sou Larissa Abreu, uma mulher negra, professora, psicóloga, nascida ao sul do mundo, em São Luís/Maranhão, Brasil. Filha de Manoel e Jesuíta, de quem eu herdei a Inventividade. Penso que inventar seja um dom de toda a periferia, porque nas margens é preciso criar de tudo: do alimento à distração. Hoje vejo que meu encontro com a colagem se inicia exatamente aí: da vontade e da coragem de inventar beleza.
Sempre tive um gosto particular em observar o que as pessoas inventam para enfeitar suas vidas. Meu pai e minha mãe, por exemplo, enfeitavam nossas moradas cada um inventando a seu modo: Mamãe nos recortes de revista, de embalagens, de fotografias; papai nos desenhos e pinturas.
Hoje tenho 33 anos, mas aos 10 eu já parturejava imagens, ao recortar revistas para inventar meus cadernos ilustrados. Isso foi coisa que aprendi com minhas primas, que também enfeitavam seus cadernos e agendas exatamente assim: colando figuras, desenhando e pintando por cima, escrevendo poemas e adágios. Flores, pássaros, rimas e caligrafias juvenis distraindo o tempo e cuidando de embelezar a vida. Ficou marcado na memória!
Aos 15 anos eu me recusava a usar as capas ordinárias dos cadernos colegiais que eram todos iguais. Então eu inventava capas que conversavam com minhas preciosidades internas, com a minha intimidade, e com minhas ausências. Inventava capas só para ter o luxo dos meus cadernos únicos, e assim, driblar o fato de que meus cadernos nem sempre eram dos mais caros, com as capas mais cobiçadas daquele tempo.
Lembro que meu grande sonho era saber desenhar como meu pai. Mas não sou aparatada para a invenção de mundos de tinta e pincel. Então foi na colagem onde eu pude me realizar como inventora de imagens.
Depois de adulta me vi distante da colagem, por que passei a achar uma coisa besta, coisa de quem não tem talento para outras coisas, e precisa se fantasiar de papel e cola.
Nem consigo dizer o quanto ter pensado algo assim me dói hoje, por que estou radicalmente convencida de que toda arte é alimento e cura!
E foi somente no caos da pandemia, em 2020, que me apareceu um fome e esse engasgo. Não quero romantizar a pandemia como uma oportunidade para qualquer coisa.
A pandemia é o que é: adoecimento, perda e sofrimento. Mas diante do mundo obscuro, com a morte à espreita em todo canto, surgiu em mim, alguém que tinha, sim, seus muitos privilégios, a necessidade de gerar alguma beleza e sentido para mim. O mundo absurdamente digital do isolamento me fez testar a virtualidade dos recortes, utilizando ferramentas de edição de fotos. Para mim,a colagem digital foi um aprendizado inesperado, e como todo aprendizado, uma descoberta de que me sou possível.
Foi só em 2022, já asfixiada pelos black mirrors na palma da minha mão, que resolvi fazer o movimento de volta ao começo. Revisitei, então, o manual dos meus antigos cadernos; os recortes maternais de enfeitar a casa; da vontade criativa das imagens de papai; e a inventividade das minhas primas e suas agendas. Dali me permiti sentir de novo o papel correr pelas mãos, ouvir a tesoura separar as imagens, grudae os dedos com a cola, e deixar que as revistas gentilmente me sussurassem miragens. E é justo assim que hoje vejo a colagem: como miragem. Onde miro a mim mesma, e onde atravesso outros mundos e olhares.

Inundação

JUlgo de Maat

Mergulho Interior

Na Beira

Retomada de Pindorama

Sem título 3

Senhora das Águas Revoltas

Utopia Tropical

Colagem como Miragem

Colar sentidos. Penso ser essa a busca incansável de toda pessoa enquanto ser de linguagem. A gente busca preencher com sentidos as lacunas daquilo que não sabemos, daquilo que queremos e que não queremos, do que precisamos e não precisamos entender, e sobretudo daquilo que almejamos ocultar e daquilo que queremos ver. Colagem como miragem é como escolhi enunciar o meu fazer colagista. E o que eu miro, é o contra-golpe anticolonial, onde toda existência contra-hegemônica ganhe sentido e força de inundação! A minha arte-miragem, o oásis para minha sede, transcende a imagem como ilusão distante, como engano ou utopia, e a coloca como mira.
É na miragem que narro novos recortes nos quais suas/nossas potências sejam visíveis e onde seja possível esperançar outros mundos e sentidos para o estar aqui e agora.
Utilizo a colagem digital e analógica, de maneira livre e sem a pretensão de ser técnica, onde o fio-condutor é a própria vontade de criar novos espelhos. Busco ressignificar imagens de pessoas que sofrem com as diversas opressões de gênero, sexual, raça e classe.
Como mulher negra que sou, dou ênfase à negritude, construindo miragens positivadas para os corpos e corpas vitimizadas pelo mundo brancocêntrico.

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